É preciso fazer uma revolução de mentalidades no comércio local

Leia AQUI a 2ª parte da entrevista e AQUI  a 3ª

Primeira parte de uma entrevista ao presidente da Associação do Comércio e Serviços da Região do Algarve, Álvaro Viegas, que faz um balanço do que tem sido a atividade levada a cabo ao longo de quase 3 anos de mandato.
Que balanço faz do trabalho realizado até agora à frente da ACRAL?
Embora os 3 anos anteriores a este mandato tenham sido de alguma estabilização e resolução de problemas que vinham do mandato mais difícil da ACRAL, o de 2009 a 2013, a situação ainda era muito difícil quando tomámos posse.
A associação tinha aderido a um Plano Especial de Revitalização (PER) e, uma vez terminado o  período de carência, começámos a pagar as respetivas prestações.
Para avaliar a gravidade da situação, basta dizer que este plano vai levar 15 anos a ser cumprido. Ou seja, eu sairei da presidência, outros virão para este lugar e terão de continuar a pagar porque a falta de cumprimento pode levar a que os credores peçam a insolvência da associação.
Em face desta realidade, houve necessidade de ‘emagrecer’ a estrutura da ACRAL, que tinha um quadro de pessoal de 17/18 pessoas quando cheguei e hoje tem cerca de uma dezena. Tivemos que sair do espaço em que estávamos porque a renda era incomportável e hoje estamos numas instalações que são da própria associação e onde, portanto, não pagamos renda.
Tivemos que redimensionar a ACRAL às novas realidades, tal como acontece nas empresas, quando passam por dificuldades. Hoje a estrutura que temos é adequada à realidade.
Em face dessas alterações, acha que a associação tem condições para continuar o cumprir o plano de pagamentos do PER ao longo de 15 anos?
Sim, o valor ainda é de alguma dimensão, mas é perfeitamente razoável, atendendo às verbas que recebemos das quotizações. Apesar de tudo, continuamos a ser a maior associação regional, a que tem mais sócios, abaixo de Setúbal.
Quantos sócios têm?
Pagantes teremos à volta de 1500 e outros tantos que, por razões diversas, não têm as suas quotas em dia e que, por isso, embora constando na lista de associados estão, neste momento, com a sua ligação à ACRAL suspensa.
 

Delegação de Lagos passa a servir o Barlavento

A reestruturação que foi levada a cabo também afetou as diversas delegações que a ACRAL tem?
Ao contrário do que acontece com outras associações regionais, que têm a sua sede e mais nenhum espaço físico, a ACRAL sempre teve várias delegações. Os nossos associados estão muito habituadas a uma presença assídua dos funcionários ou dirigentes da ACRAL e isso fez com que, ao longo de muitos anos, a associação tenha tido delegações em Vila Real de Sto. António, Olhão, Tavira, Loulé, Albufeira, Portimão, Lagos e também chegou a possuir uma em Silves, para além da sede, que está instalada em Faro.
É claro que em pleno século XXI, com a facilidade de comunicação que há, com os que temos para fazer chegar a informação aos associados, como o site, o jornal online, as newsletters e o Canal Algarve, não se justifica que tenhamos que ter espaços físicos com os respetivos funcionários a 10 ou 20 quilómetros da sede ou entre cada um deles e, portanto, temos vindo a encerrar algumas delegações.
No Sotavento fechámos as delegações que existiam na zona geográfica que vai de Faro até Vila Real de Sto. António. Mantivemos a de Loulé, que já existe há 40 anos, e tínhamos um espaço em Portimão que já não temos, pelo que, neste momento, a delegação de Lagos funciona como a do Barlavento.
A delegação de Portimão não voltará a abrir?
As instalações que ocupávamos resultaram de um protocolo que assinámos com a Câmara de Portimão. Estranhamente, passado um ano, recebemos uma carta da Câmara a cancelar esse protocolo e dando-nos até ao dia 30 de Setembro para sairmos sem nos dar qualquer tipo de justificação.
Achamos estranho que a Câmara de Portimão tenha tido esta postura com uma associação que existe no concelho de Portimão há 40 anos. Portimão é, de resto, a seguir a Faro, o concelho em que temos mais sócios.
A ACRAL sobreviveu a vários presidentes de Câmara e vai continuar a fazer o seu trabalho em Portimão, como faz em todo o lado, com ou sem apoio da Câmara.
 

Mudança dos horários é fundamental

Com a parte financeira da ACRAL relativamente bem encaminhada quais são os projetos que tem para o futuro?
Quando cá chegámos já tínhamos o projecto Algarve Store, que é uma plataforma digital que permite que os produtores da nossa região possam ter uma loja virtual. E isto vai ao encontro daquilo que tenho defendido há muito tempo: que o comércio está a mudar e vai ter de continuar a mudar.
Quer os empresários queiram ou não queiram, a mudança passa pela compatibilização de um espaço físico, uma loja, com um espaço virtual. Hoje já muita gente a ir a lojas, sobretudo instaladas nas grandes superfícies, onde escolhe uma determina peça de roupa ou calçado e não a compra de imediato. Tira uma fotografia ao respetivo código, chega a casa, entra na página dessa loja, escolhe a peça, a cor, o modelo que deseja e faz a encomenda, a qual é-lhe entregue em casa sem qualquer custo. Isto é o futuro para o qual o restante comércio deve caminhar.
Acha fácil fazer entender isso aos pequenos comerciantes?
Há uma revolução de mentalidades que é preciso levar a cabo. Penso que os comerciantes mais antigos terão algumas dificuldades em ir por esse caminho, mas, com a chegada ao comércio de uma nova geração, isso vai ser uma realidade. Vai levar 5, 10 anos, provavelmente, porque a mudança de mentalidades é o mais difícil.
Nós conseguimos mudar uma loja numa semana, conseguimos mudar o software em 15 dias, conseguimos fazer obras em pouco tempo mas mudar uma mentalidade leva, por vezes, uma geração.
Por exemplo, a alteração dos horários é uma luta que tenho desde a primeira vez que ocupei o  cargo de presidente da ACRAL, entre 1999 e 2002. Estavam a aparecer os primeiros centros comerciais na região e já na altura eu dizia que os horários (9/13h e 15/19h) que então eram praticados e que continuam a sê-lo ainda hoje estavam ultrapassados.
Se alguém sai do seu emprego às 18 ou 19 horas e quer ir ao comércio local não pode porque a essa hora as lojas já fecharam, quer seja de verão ou de inverno… e de verão ainda entendo menos. Temos que nos ajustar sem haver necessidade de aumentar a carga horária porque também não podemos pedir aos trabalhadores que trabalhem 12 em vez de 8 horas.
Devemos perguntar-nos se faz sentido continuar a abrir as lojas às 9 horas da manhã ou se é preferível abrir as portas mais tarde e fechá-las também mais tarde. É claro que colocam-se questões de ordem prática sobre como é que vamos adaptar o facto das lojas fecharem às 20 ou 21 com a nossa vida pessoal. Mas há soluções, os espanhóis já fazem isso, têm um horário diferente, só temos que perceber como é que é possível fazer essa adaptação. Agora a realidade é clara: se nada for feito nós vamos continuar a empurrar os clientes para as grandes superfícies.
 

“Há passos no bom caminho que estão a ser dados”

A ACRAL tem levado a cabo algumas acções no sentido de tentar implementar essas ideias? Acha que é possível convencer os comerciantes dessa necessidade, a curto prazo?
É difícil. Como disse, a questão dos horários já é debatida há uns 20 anos. Mas há passos no bom caminho que estão a ser dados.
Em Faro, por exemplo, no verão, e ao longo de várias sextas-feiras, temos implantado o Baixa Street Fest, levando muita animação às ruas e fechando o comércio às 23 ou 24 horas e tem sido um sucesso. O que é pena é não ter continuidade. Nessas sextas-feiras, vão para as zonas comerciais milhares de pessoas e as lojas têm com certeza vendas, que é isso que se pretende.
Em Loulé, este ano, replicou-se, de alguma forma, este modelo, mas às quintas-feiras. Aí, como foi o primeiro ano, a adesão dos comerciantes não foi muito grande, mas pretende-se repetir a experiência em 2019, provavelmente já com um número mais alargado de comerciantes.
Era importante que outros municípios pudessem replicar esse modelo pois a ACRAL sozinha não consegue fazer isso. Podemos fazer o trabalho de sensibilização junto dos comerciantes, mas há que fazer o investimento na animação, temos que ter motivos para que as pessoas venham às zonas do comércio local.
Se vamos pedir que os comerciantes invistam na animação, eles não aderem, o que me deixa um pouco desiludido. Um comerciante que tenha uma loja no Mar Shopping ou noutro centro comercial qualquer sabe que no valor mensal que tem de pagar está uma componente para a animação. No entanto, se o mesmo comerciante tem uma loja numa rua acha que aí não deve pagar, que isso compete à ACRAL ou à Câmara.
Na minha ótica aquilo que era razoável é o que já se faz no turismo, em termos de promoção, em que o Estado, através do Turismo de Portugal, apoia essas acções em 50% e os privados põem os restantes 50%. Era aceitável que na atividade comercial acontecesse o mesmo. Vamos ter animação no Verão em Faro, Portimão ou Lagos, a Câmara – que é o estado – apoia com 50% e os privados deviam contribuir com os restantes 50%, mas isso não acontece.
Infelizmente falta também esta mudança de mentalidade que leve os comerciantes a perceber que devem investir na sua zona, na animação e que vão ter retorno.
Outras autarquias têm mostrado interesse em implementar programas de animação como os de Faro e Loulé?
É um processo lento. Sempre que tenho reuniões com autarcas tenho falado nisso. O modelo não tem que ser necessariamente igual ao destes concelhos, o importante é o princípio, é criar condições para que os estabelecimentos comerciais estejam abertos em horário noturno, no verão, através de iniciativas que tenham intervenção por parte do comércio e da autarquia. Pelo menos nas principais cidades era interessante que as autarquias olhassem para estes exemplos e avançarem com soluções parecidas.

2ª parte da entrevista:

“Se nada for feito, as baixas comerciais vão morrendo pouco a pouco”


3ª parte:

ACRAL tem projeto de construção de centro de negócios de um milhão de euros

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